Quais são os conceitos de Sṛṣṭi Krama, Sthiti Krama e Anta Krama e qual é o seu significado em relação à prática de Āsana, Prāṇāyāma e Dhyānam?
Podemos abordar essa afirmação e a questão de sua relação com a prática a partir de uma perspectiva cronológica e, dentro dela, de uma perspectiva psicológica. Segundo os ensinamentos de Yoga de Krishnamacharya, existem três estágios cronológicos e psicológicos da vida, ou Tri Krama, nomeados por ele como Sṛṣṭi Krama, Sthiti Krama e Anta Krama.
1. Sṛṣṭi Krama
O primeiro Krama é o estágio de crescimento e expansão, conhecido como Sṛṣṭi. Aqui, cronologicamente, o ponto de partida é a idade em que as pessoas tradicionalmente começavam a prática de Yoga no aspecto de Āsana.
“Uma pessoa está apta a praticar quando consegue comer sozinha.”
– T. Krishnamacharya
Esse é o estágio para desenvolver o corpo e suas habilidades associadas, como força, coordenação e mobilidade, por meio da prática de muitos e muitos Āsanas. Além disso, obviamente, com pessoas muito jovens, seu interesse e atenção estarão mais engajados ao usar uma ampla gama de Āsanas desafiadores e sequências progressivas baseadas em coreografia, envolvendo habilidades proprioceptivas como saltos e técnicas de foco, como aprendizado de movimentos baseados em números.
“Śikṣaṇa tem diferentes Krama que podem ser analisados.
Por exemplo, Sṛṣṭi Krama para crescer, criar, desenvolver – física ou mentalmente.
Em algumas situações, Sṛṣṭi Krama é mais importante.
Por exemplo, em Āsana, ideias de relaxamento não são válidas.
Então mais trabalho, mais força, mais atividade.”
– TKV Desikachar
Esse é o contexto da fase da vida em que alguns dos primeiros alunos de Krishnamacharya, agora vistos como fundadores de estilos modernos de Yoga baseados em Āsana, começaram a aprender quando eram adolescentes. Segundo Krishnamacharya, esse estágio terminava por volta dos 24 anos, quando se passava para a fase de vida de chefe de família (atualmente chamamos de adulto funcional), geralmente baseada em um estilo de vida ligado a constituição de família e ao trabalho.
2. Sthiti Krama
O segundo Krama cronológico é o estágio de permanecer ou manter-se em uma condição. Em outras palavras, a autossustentação, manutenção e apoio contínuos do dia a dia de nossa vida, conhecido como Sthiti Krama.
Quando você está na vida de trabalho, relacionamentos e família, quem tem tempo para praticar Āsana três horas por dia, quanto mais outros aspectos da prática de Yoga? As prioridades mudam. Há um ensinamento de T. Krishnamacharya, em sua composição Yoga Rahasya, que diz que quando você tem uma vida baseada em constituição de família e trabalho, você precisa cuidar de sua família, de seu trabalho, de seus parentes, do sacerdote, do mendicante… quanto tempo sobra para cuidar de si mesmo?
“Tendo crescido, não envelheça muito cedo, vamos manter o status quo.
Sthiti Krama é para uma pessoa que tem responsabilidades, casamento, trabalho.
Não é mais um estudante em tempo integral.
Ainda há tempo para Svādhyāya.
Preservação do que você recebeu como estudante.
Então, Sthiti Krama é muito crucial na vida de alguém.
A diferença é que você tem suas próprias responsabilidades.
Você não pode abandoná-las para estudar isso ou aquilo.
Considerado importante porque é um desafio dos 25 aos 60 anos sustentar essa posição.
Porque é muito difícil, há um (grande espaço para dar desculpa) para escapar do Svādhyāya.
Devemos fazê-lo para lidar ou abordar problemas ao nosso redor – filhos, alunos, etc.”
– TKV Desikachar
Durante esse período, também ocorre uma mudança de desenvolvimento psicológico. Na visão de Krishnamacharya, você já dominou o Āsana, por assim dizer, e agora a prioridade é manter a intensidade da sua energia vital ou Prāṇa Śakti. A prática de Yoga agora é priorizada para sustentar mais a estabilidade energética, mental e emocional. Esse estágio é conhecido como Sthiti Krama, onde a necessidade é mais energética e, especialmente, psicológica, do que fisiológica.
“Para o chefe de família, em linha com Sthiti Krama,
a prática mais importante é o Prāṇāyāma.”
– T. Krishnamacharya
O treinamento inicial de Āsana apoia sua vitalidade e saúde física, mas agora é hora de sustentar sua vitalidade psicológica. Assim, o Prāṇāyāma torna-se o foco principal, com o Āsana sendo uma prioridade secundária.
“Sthiti Krama é uma transição para o próximo estágio,
onde você começa a aceitar o inevitável.
Há um grande Saṃskāra da juventude.
Então aceitamos que o sol vai se pôr.
Você come menos, reflete mais, pensa em Deus.”
– TKV Desikachar
3. Anta Krama
O terceiro estágio cronológico é conhecido como Anta Krama, ou a última parte, aquela fase final da vida em que nossas prioridades mudam novamente. Se você tem filhos, eles já estão crescidos e, com sorte, independentes. Você não tem as mesmas ambições no trabalho, e sua perspectiva sobre a imortalidade muda para uma perspectiva que se envolve cada vez mais com a noção de mortalidade.
“Inicialmente, nosso Sādhana de Yoga é
sobre nosso relacionamento com a vida.
Em última análise, nosso Sādhana de Yoga é
sobre nosso relacionamento com a morte.”
Gradualmente, o mundo exterior não exige mais tanta atenção. Em vez disso, é o mundo interior que desperta mais interesse. Nossa perspectiva de vida diminui e se internaliza à medida que nos aproximamos do final desse ciclo de vida, como uma folha que deixa a árvore e retorna ao ponto de partida.
A questão é como apoiar positivamente essa mudança inevitável no corpo, na respiração, na mente e nas emoções de forma a abraçar sua mensagem interna, embora dentro da pulsação de Abhiniveśā e de sua perturbação inerente?
“Abhiniveśā é o extraordinário impulso instintivo de sobreviver a qualquer custo.
Ninguém está isento. De certa forma, é uma aversão à própria morte.”
– T. Krishnamacharya
No primeiro estágio, a prioridade era mais fisiológica. No segundo estágio, era mais psicológica. Nesse terceiro estágio, a prioridade agora está mais voltada para as dimensões espirituais no cerne de nossa vida interior e sua interface inevitável com as pulsões de sobrevivência. Aqui, essas explorações finais em direção à fonte do ser são encontradas dentro da prioridade de Dhyānam como nossa prática principal.
“Uma pessoa fisicamente apta
e que foi purificada pelo Agni de Dhyānam
não tem medo de doenças, idade ou morte.”
– T. Krishnamacharya
Assim, no terceiro estágio, Āsana e Prāṇāyāma ainda têm seu lugar, mas o foco é muito mais em torno da ideia de Dhyānam, ou meditação sentada, investigando qual é a verdade última dentro da impermanência e sua relação com a noção de morte.
Dentro desse foco de Dhyānam, cultiva-se o insight sobre a natureza da natureza para compreender o que não é natureza, reconciliando-se com isso antes do fim da experiência personalizada de existência e ser, até a reabsorção na matriz última.
“Não há morte para o Puruṣa,
porque não há mudança para ele,
e o que é a morte senão mudança.”
– TKV Desikachar
Artigo de Paul Harvey, professor dos mantenedores do Shodashi Yoga, postado originalmente no site yogastudies.org.
Foto: Tirumalai Krishnamacharya e suas filhas Puṇḍarīkavallī e Alamelu nos anos 1930’s.