Yoga como Visão, Prática e Ferramenta – Parte 1
Rāja Yoga – Yoga e Samādhi
A Visão, o Caminho e o Objetivo rumo ao Samādhi segundo o Yoga Sūtra de Patañjali
É interessante que, como professor de Yoga, a pergunta que mais ouço atualmente é: “Que tipo de Yoga você pratica?” em vez de “O que é Yoga?”. Ou pensamos que já sabemos o que é Yoga ou, mais provavelmente, a visão está se perdendo em meio às inúmeras formas como o Yoga é oferecido.
Hoje em dia, parece haver pouca clareza aparente sobre o que é Yoga ou, se há uma visão, ela não é muito evidente. Essa visão também pode ser influenciada por aspectos religiosos, como o hinduísmo e o sikhismo, ou por paradigmas de trabalho corporal, como cultura física, musculação, ginástica e até mesmo luta.
No mundo do Yoga de hoje, especialmente no Ocidente, parece que muitos professores ensinam sem uma visão clara do que é Yoga e de como podemos realizar essa visão.
Veja, por exemplo, como nem sequer sabemos ou usamos o termo de Yoga para meditação. O termo frequentemente utilizado é Āsana, Prāṇāyāma e Meditação. Ou, quando dizemos “Vou fazer Yoga”, geralmente nos referimos a pegar o tapetinho em vez do zafu (almofada de meditação). É possível até encontrar sites e textos de Yoga que mencionam Yoga e Meditação como se fossem coisas diferentes. Que tal reconfigurarmos para “Yoga é meditação”?
Quando pensamos no que é apresentado como Yoga atualmente, onde está a visão? Precisamos de uma visão, precisamos saber como acessá-la e precisamos saber como estabilizá-la e sustentá-la.
No Yoga, a visão é explorada de forma mais eloquente no Yoga Sūtra, cujo foco principal é a relação entre dois aspectos que constantemente interagem para sustentar nosso senso de si e individualidade.
Os dois aspectos são: a atividade perpétua da mente ou Citta e a qualidade sempre presente de quietude inerente à consciência de Cit. Quando Citta domina, estamos mais no passado do que no presente, e quando Cit domina, estamos mais no presente do que no passado.
A premissa do Yoga Sūtra é que, quando o passado assume o controle, somos mais propensos a agir e interagir de maneira não habilidosa. Mesmo em diferentes aspectos de nossa prática de Yoga, quando surge um distúrbio, é porque o passado assumiu o controle – uma memória emergiu.
Entretanto, se não houvesse passado, não haveria Citta. Citta é como um cofre cheio de memórias passadas. Dentro desse processo sempre ativo, queremos criar um espaço entre impulso e reação.
Então, ao observarmos muitas aulas de Yoga hoje, qual é a visão com base na qual estamos guiando a direção de um grupo? O Yoga argumentaria que, em última análise, queremos capacitar o aluno a ter a habilidade de sentar-se e experimentar uma qualidade de quietude.
Se o professor não tiver uma “visão” para inspirar e guiar, enquanto acomoda as muitas peculiaridades das aulas de Yoga de hoje, é mais provável que a visão se dissolva nas muitas nuances da performance postural.
Uma visão do Yoga seria que uma aula em grupo se mova do ponto de partida da fisicalidade para algum ponto de quietude, dando aos alunos uma experiência de “sentar” e experimentar o potencial de quietude em algum momento do processo.
A prioridade, em termos do que estamos tentando ensinar, é a “quietude” ou uma experiência de “Cit”. Posso estar presente dentro das atividades da mente? Quanto mais tempo posso estar presente, mais consciência pode emergir.
Quando as pessoas tocam essa quietude, algo acontece – um desejo de se afastar do domínio das atividades de Citta.
Quanto mais voltamos no tempo com o Yoga, mais vemos que o objetivo era a conquista da habilidade de sentar-se e experimentar a quietude. Quanto mais avançamos no tempo com o Yoga, mais vemos o movimento em direção ao aumento da fisicalidade.
A visão se resume principalmente à relação ou união entre atividade (Citta) e quietude (Cit), a fim de facilitar a emergência da quietude na paisagem da mente.
Imagens como a emergência do sol (clareza) enquanto a nuvem (confusão) recua podem ajudar a transmitir uma ideia do processo.
Quando um aluno chega ao final da prática, algo o toca. Trata-se do assentamento da mente na quietude. O fluxo de Citta assentando-se na presença de Cit.
Não seria responsabilidade do professor de Yoga guiar os alunos para essa experiência e capacitá-los a perceber que podem tocar esse espaço sagrado por si mesmos, fora do ambiente da aula ou prática guiada?
Artigo de Paul Harvey, professor dos mantenedores do Shodashi Yoga, postado originalmente no site yogastudies.org.